Um recente de estudo investigou como as estatinas podem causar intolerância à glicose e resistência à insulina, e se esses efeitos estão relacionados à microbiota intestinal e ao metabolismo dos ácidos biliares, especialmente à produção de GLP-1 (glucagon-like peptide-1).
Desenho e Métodos
- População humana: 30 pacientes com hipercolesterolemia tratados com atorvastatina + 10 controles saudáveis, acompanhados por 16 semanas.
- Análises: metabolômica e metagenômica de fezes e sangue, além de testes de glicemia, HbA1c, insulina, C-peptídeo e GLP-1.
- Modelos animais: camundongos C57BL tratados com atorvastatina, germ-free e com transplante de microbiota fecal (FMT).
- Intervenções experimentais:
- Colonização com Clostridium sp. (bactéria produtora de enzimas HSDH envolvidas na conversão de CDCA→UDCA).
- Suplementação com ácido ursodesoxicólico (UDCA), tanto em camundongos quanto em pacientes humanos.
Principais Resultados
1. Efeitos clínicos da atorvastatina
- Redução esperada do colesterol total e LDL.
- Aumento significativo da HbA1c, insulina e HOMA-IR após 4–16 semanas.
- Redução progressiva dos níveis séricos de GLP-1, mesmo sem aumento da glicemia de jejum inicial.
2. Alterações na microbiota e nos ácidos biliares
- Diminuição acentuada da abundância do gênero Clostridium, especialmente espécies produtoras de 7α-hidroxiesteroide desidrogenase (HSDH).
- Essa redução levou à queda de UDCA (ácido ursodesoxicólico) e aumento de CDCA (ácido quenodeoxicólico), elevando a razão CDCA/UDCA.
- Como consequência, ocorreu menor ativação de receptores TGR5 e FXR, reduzindo secreção intestinal de GLP-1 e prejudicando a homeostase glicêmica.
3. Experimentos em animais
- Camundongos tratados com atorvastatina apresentaram:
- Maior intolerância à glicose e resistência à insulina.
- Menor nível sérico de GLP-1.
- Redução de Clostridium e de HSDH.
- Diminuição do gasto energético e da razão de troca respiratória (RER), indicando menor oxidação de glicose e maior uso de lipídios.
- Esses efeitos não ocorreram em camundongos germ-free (sem microbiota), provando a dependência da microbiota intestinal.
4. Reversão com Clostridium ou UDCA
- A colonização com Clostridium sp. restaurou os níveis de GLP-1, melhorou tolerância à glicose, aumentou RER e energia gasta.
- A suplementação com UDCA (50 mg/kg em camundongos) também:
- Aumentou GLP-1 plasmático.
- Melhorou a sensibilidade à insulina e o metabolismo energético.
- Não interferiu no efeito redutor de colesterol das estatinas.
5. Validação em humanos
- 5 pacientes com intolerância à glicose induzida por estatina receberam UDCA (500 mg/dia por 2 meses).
- Houve redução de HbA1c, insulina e C-peptídeo, além de aumento de GLP-1.
- Nenhuma alteração negativa nos lipídios; HDL aumentou.
- Marcadores hepáticos (ALT/AST) melhoraram.
Mecanismo proposto
- Estatina → reduz Clostridium spp. → menos HSDH → menos conversão de CDCA → UDCA.
- Menos UDCA → menor ativação de TGR5/FXR → redução de secreção intestinal de GLP-1.
- Menos GLP-1 → redução da secreção de insulina e aumento da resistência à insulina.
- Resultado: intolerância à glicose e risco aumentado de diabetes induzido por estatina.
- UDCA ou Clostridium sp. → restaura o eixo microbiota–bile acids–GLP-1, corrigindo a disfunção glicêmica.
Implicações clínicas
- O estudo identifica um mecanismo microbiota-dependente para a hiperglicemia associada às estatinas.
- UDCA (ácido ursodesoxicólico) surge como terapia adjuvante promissora, capaz de reduzir o risco de diabetes induzido por estatinas sem interferir no efeito hipolipemiante.
- Sugere-se o desenvolvimento de preparações combinadas estatina + UDCA ou uso dirigido de probióticos com Clostridium produtores de HSDH.
Limitações
- Amostra humana pequena (n=40).
- Parte dos pacientes tinha histórico prévio de diabetes/metformina.
- Sequenciamento 16S em camundongos (não metagenômica completa).
- Estudos maiores e multicêntricos são necessários para confirmar os efeitos de longo prazo.
Conclusão
“As estatinas podem agravar resistência à insulina e intolerância à glicose ao alterar a microbiota intestinal, reduzindo Clostridium spp., UDCA e GLP-1. A suplementação com UDCA ou a reposição de Clostridium sp. restaura a homeostase glicêmica, sem prejudicar a ação hipolipemiante. O trabalho propõe o “eixo Clostridium-UDCA-GLP-1” como novo alvo terapêutico para prevenir disfunções metabólicas associadas ao uso de estatinas. Os médicos precisam se alertar urgentemente sobre isso, pois temos de enxergar a paciente como um todo e não apenas um exame de colesterol.” – Afirma o Dr. Daniel Benitti, cirurgião vascular médico especialista em Lipedema que atende em São Paulo, Campinas e a distância (online).
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